segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Brasão da Família GLUFKE no Brasil





O BRASÃO DA FAMÍLIA GLUFKE é composto do ESCUDO, com seus símbolos, do ELMO de cavalheiro e dos PAQUIFES, com as cores do escudo.

O BRASÃO compõe a junção de três símbolos:

1º QUARTEL: na parte superior à esquerda, em cor prata (representado pela cor branca), com monograma das letras A R em preto, representa o escudo de Brockau cidade natal do patriarca ERNST KARL GLUFKE. No mesmo quartel, na parte inferior à esquerda, em cor azul, com o símbolo de uma roda em preto, com duas asas em prata, simboliza o antigo emblema dos ferroviários da Alemanha.

2º QUARTEL: à direita, em cor vermelha com um castelo em prata, com um cão de guarda na porta do castelo, representa o escudo de Quedlinburg cidade natal da matriarca ELISE HENRIETTE MARIE BÖTTGER GLUFKE.

3º QUARTEL: nas cores verde e amarelo e de banda ondulada em prata (representado pela cor branca), simbolizam a vinda ao BRASIL em 1909 e o Rio Uruguai com uma balsa em marrom, de bigorna em amarelo, de arado em amarelo e de roda em aros amarelos e contornos pretos.
Da FITA em prata (representado pela cor branca) com detalhe em azul, do NOME GLUFKE em preto.
  
DESCRITIVO COMPLEMENTAR



01 - PRIMEIRO QUADRANTE

O primeiro quadrante à esquerda do escudo da Família Glufke, representa o escudo da cidade de BROCKAU, a terra natal, onde em 13 de março de 1878 nasceu o patriarca ERNST KARL GLUFKE. A cidade fica próxima de BRESLAU, na região da Silésia, e que na época pertenciam à Alemanha. Atualmente essas cidades se chamam BROCHÓW e WROCLAW e pertencem à Polônia, pois a região da Silésia passou a ser território polonês desde o final da 2ª Guerra Mundial.
No escudo de BROCKAU, as letras A e R unidas simbolizam o “DOMKAPITEL”, católico de BRESLAU, ou seja, o colegiado de bispos da catedral dessa cidade, e que também eram os senhores feudais de BROCKAU.
Sobre o fundo azul a representação da roda com duas asas simboliza o antigo emblema dos ferroviários da Alemanha. E durante certo período, BROCKAU foi um importante centro ferroviário da região, especialmente para o transporte de produtos regionais, entre os quais se destacava o sal mineral.
Esse emblema tem um significado especial para o brasão familiar pois quando ERNST KARL GLUFKE nasceu, seu pai GOTTFRIED GLUFKE trabalhava como ferroviário na cidade de Brockau.


02 – SEGUNDO QUADRANTE

O segundo quadrante à direita do escudo da Família Glufke, representa o escudo da cidade de QUEDLINBURG, que fica na região da Saxônia, Alemanha, cidade natal, onde em 28 de janeiro de 1881 nasceu a matriarca ELISE HENRIETTE MARIE BÖTTGER GLUFKE.
No escudo de QUEDLINBURG, a representação significa uma parte dos antigos muros da cidade, mostrando duas torres num dos acessos, e sentado no portão está o cachorro QUEDEL. Várias lendas se referem ao cão como guardião dos portões, e segundo uma delas, durante um dos ataques à cidade, QUEDEL teria acordado os moradores alertando-os da aproximação dos inimigos. Outra lenda conta que ele pertencia à princesa Mathilde, fundadora do “Stifft”, uma fundação leiga para mulheres da nobreza, tendo a cidade recebida esse nome em homenagem ao cachorro.
QUEDLINBURG tem mais de 1000 anos de história, e as abadessas do “Stifft”, governaram a cidade durante séculos, época na qual a cidade foi uma espécie de “Capital do Reino” da Saxônia. A Igreja e o castelo constituem, até hoje, o principal marco de Quedlinburg e ELISE HENRIETTE MARIE BÖTTGER GLUFKE, nasceu em uma casa que ficava a poucos metros dali, sendo que da sua casa via-se os muros e as torres da Igreja. Atualmente QUEDLINBURG reúne um expressivo conjunto de casas em estilo enxaimel do mundo, algumas com mais de seiscentos anos, razão pela qual recebeu o título de “Patrimônio Cultural da Humanidade”.

03 – TERCEIRO QUADRANTE

Representa a vinda de KARL e ELISE GLUFKE, ao Brasil no dia 11 de outubro de 1909. Estabeleceram-se inicialmente em Ijuí e depois em Neu- Württemberg, atual Panambi, onde mantinham uma olaria e ao mesmo tempo dedicavam-se no árduo TRABALHO BRAÇAL DA COLONIA, simbolizado neste quadrante pelo ARADO.
O tempo passou, os filhos cresceram e na busca de uma vida melhor mudaram-se para Porto-Feliz, atual Mondaí, Lajeado, Porto Alegre, Ijuí e outros lugares.
Novas atividades surgiram na vida da Família Glufke, entre elas a FERRARIA, simbolizada pela BIGORNA, colocada no lado esquerdo deste quadrante. Tornou-se uma atividade marcante na vida de Fernando Sörensen, esposo de Frieda Glufke e seguido por seus filhos. A ele se deve as bonitas cruzes e grades de ferro, feitas com muita arte e belíssimo acabamento, que ainda hoje podem ser admiradas nas sepulturas familiares. Também Germano Glufke aos 14 anos foi aprendiz numa ferraria, onde trabalhou até a idade de prestar serviço militar. A ferraria foi também especialidade de outros descendentes da família.
Os VEÍCULOS de Transportes de Cargas e de Passageiros, simbolizados pela RODA, colocada à direita deste quadrante, iniciou na vida familiar de Karl e se estende por várias gerações nos transportes de carga da empresa de Waldemar E.Glufke e descendentes, em Mondai, Cruz-Alta e Carazinho e nos transportes coletivos de Helmuth Glufke, Willy Glufke, Hedwig Glufke Kertész Simoni, Germano Glufke e nos filhos de Herta Glufke Stobäus e Erna Glufke Hinnah e dos respectivos descendentes em várias localidades destacando-se Lajeado e Porto Alegre.
A BANDA ONDULADA PRATA no meio do 3 º quartel, representa o Rio Uruguai, tendo em destaque a figura de uma BALSA, que representou importante atividade para Família Glufke: a exportação de madeira iniciada em 1928, formado pelas famosas balsas de toras, que desciam o rio Uruguai, rumo à Argentina, passando pelo perigoso Salto Yucumã. Nessas temidas e ao mesmo tempo fantásticas viagens, temos a participação dos bravos empreendedores como “madeireiros, lancheiros e balseiros”: Waldemar Ernesto Glufke, Germano Glufke e Willy Glufke.


Carl e Elise - um pouco de história

Infância e juventude



Ernst Carl Glufke, chamado de CARL, nasceu a 13 de março de 1878, em Brokau, arredores de Breslau, na Silésia, Alemanha. Era filho de Gottfried Glufke, nascido em Qualwitz, Kreis Ohlau, e de Rosina Tinzmann Glufke, nascida em Beckern, Kreis Ohlau, na Alemanha. Também estas localidades situam-se nas proximidades de Breslau.

Elise Henriette Marie Böttger Glufke, chamada ELISE, nasceu em 28 de janeiro de 1881, em Quedlinburg, na Saxônia, Alemanha. Era filha de Elise Böttger.

Pouco se sabe sobre a infância e a juventude de Carl e Elise.

Aos 2 anos de idade, Carl perdeu a mãe; o pai faleceu quando Carl tinha 8 anos.

Carl foi criado por um tio. Quando menino, pensava que a vida na casa do tio era difícil e que este o maltratava, opinião que mudou ao chegar a idade adulta. Aos 14 anos, fugiu de casa e foi para Hamburgo. Lá queria embarcar em algum navio com destino à América. Como não tinha dinheiro para a passagem, pretendia trabalhar no navio durante a travessia.

Enquanto aguardava, irrompeu em Hamburgo uma epidemia de cólera. A cidade ficou em quarentena, não se permitindo a ninguém entrar ou sair dela. A epidemia foi muito intensa e havia poucos recursos para enfrentá-la. Em conseqüência, muitas pessoas morreram às vezes em plena rua. Para sobreviver, Carl juntou-se aos que recolhiam mortos nas casas e nas ruas. Quando nesse trabalho, teve a sorte de ser visto por um carpinteiro que, por achar a atividade inadequada para um rapazinho, o acolheu em sua casa. Carl ficou morando com a família desse senhor, tornou-se aprendiz de carpinteiro e desistiu da América.

Nessa época, na Alemanha, aprender um ofício incluía uma etapa de aprendizagem intensiva (chamada Lehrzeit), sob orientação de um mestre de ofício, e geralmente no local de trabalho deste. O jovem era chamado Lehrling (aprendiz) e ao final da etapa deveria se submeter a certas provas. Se aprovado, o aprendiz passava a uma etapa de “aperfeiçoamento” e era chamado de Geselle (oficial). A parte final desta etapa incluía a Wanderzeit, período em que o jovem tinha de ir para outras localidades, conseguir trabalhos temporários nas mesmas, e, assim, provar sua competência. O jovem só podia se submeter às provas finais de sua aprendizagem, para se tornar mestre de ofício, depois de cumprir essa exigência.

Foi quando cumpria sua Wanderzeit que Carl chegou a Dittfurt e conheceu Elise. Ao que se sabe, não completou a tarefa, não chegou a mestre e, tempos depois, tornou-se vendedor de máquinas de costura Singer.



Elise foi registrada só com o sobrenome da mãe (Böttger); não se tem informações quanto ao nome do pai. Seus pais eram noivos quando ele sofreu um acidente: caiu do “Heuwagen” e morreu. Deixou Elise (mãe) grávida. Ela, posteriormente, casou com Andréas Blath, com o qual teve dezoito filhos, entre eles quatro pares de gêmeos. A maioria desses filhos morreu nos primeiros meses de vida, inclusive todos os gêmeos. Chegaram à idade adulta: Marie, Minna, Frieda e Luise.


Elise passou parte da infância e da adolescência em casa dos avós maternos. Ela contava que o avô e o padrasto, que considerava como pai (há referências a ela como Elise Blath) , eram muito severos. Por essa razão e devido às condições módicas de vida da família, a juventude de Elise não foi muito alegre. O fato mais importante da semana era o culto evangélico aos domingos. Já idosa Elise era capaz de lembrar textos bíblicos comumente citados em datas específicas do calendário religioso.

Em relação à avó materna de Elise – chamada Henriette Maurer Hoebbel – um fato merece ser lembrado, por ser incomum e totalmente estranho para nós, cidadãos do final do século 20: ela foi vivandeira (Mulher que vende mantimentos, ou os leva, acompanhando tropas em marcha) na guerra de 1870, da Alemanha contra a França.


A família de Carl e Elise na Alemanha

Carl e Elise casaram em Ditfurt-Quedlinburg, no dia 10 de novembro de 1898.
Foram morar em Tangermünde, onde nasceram os filhos Erna (1899), Waldemar (1900) e Frida (1902).

Na Alemanha daquele tempo já era difícil alugar moradia para uma família numerosa, sem casa própria. Era o caso dos Glufke – o casal e seus filhos, cujo número aumentava rapidamente. Além disso, havia dificuldades financeiras, pois Carl não tinha profissão definida; sustentava a família como vendedor de máquinas Singer.

Como intuito de contribuir para o sustento da família, Elise cursou o Königliche Hebammen Schule (Escola Real de Formação de Parteiras), em Magdeburg, na Saxônia. Formou-se em 1901, passando a exercer a profissão de parteira. Esse fato evidência a determinação de Elise e sua coragem para resolver problemas, baseada em uma decisão bastante “avançada” para os padrões da época.

Em abril de 1903, a família se transferiu para Quedlinburg, por pouco tempo, pois em agosto do mesmo ano foi morar em Hoym; nesta localidade nasceu o filho Alfred (1904). Em abril de 1905, os Glufke voltaram a morar em Quedlinburg, onde nasceu a filha Herta (1907). Pouco depois, fizeram nova mudança, desta vez para Süderode.

Essas localidades – Quedlinburg, Hoym, Süderode – são muito próximas umas das outras. Um pouco mais afastada é Magdeburg, mas ainda próxima. Por isso, as freqüentes mudanças de residência não envolviam mudança significativa de vida.

No entanto, uma grande mudança estava por acontecer, pois foi em Süderode que os problemas enfrentados pela família e a perspectiva de um futuro melhor para os filhos levaram o casal Carl-Elise à decisão de emigrar. Destino: Brasil, mais precisamente Ijuí, no Estado do Rio Grande do Sul.

Vista à distância do tempo e do lugar em que foi tomada, essa decisão sugere duas perguntas? Por que emigrar? Por que o Brasil?

Evidentemente, há outros motivos para emigrar, como razões políticas ou religiosas, especialmente se consideradas as perseguições que, quase sempre, acompanham períodos de fanatismo de um ou de outro tipo. No caso dos Glufke, foram razões econômicas as que determinaram a decisão. Eles eram pobres – o que não deve ser confundido com miséria – e não tinham condições de adquirir casa própria quando até alugar era difícil para famílias numerosas. Os ofícios que Carl e Elise exerciam também não lhes proporcionavam perspectivas melhores para o futuro.

E por que o Brasil?

Quando a idéia de dar um novo rumo aos destinos da família surgiu, Carl e Elise pensaram, inicialmente, em ir para Camarões, na África, na época um protetorado alemão. Estavam ainda na fase de amadurecimento da idéia quando souberam que se procuravam pessoas interessadas em migrar para o Brasil. Ofereciam-se viagem gratuita para a família e 25 hectares de terra para o plantio, em zona de colonização; a terra deveria ser paga posteriormente. Na Alemanha de então – e para muitos alemães da atualidade – 25 hectares significavam uma extensão enorme de terra, algo como ser proprietário de um condado. Naturalmente, ninguém tinha uma noção muito clara do que significava “terra em zona de colonização”. É válido perguntar também: Que imagem trazia às mentes do casal Glufke a palavra “wald” (mato, floresta, bosque)? Os bosques de sua terra natal certamente pouco tinham em comum com o mato que iriam encontrar no Brasil.

Com idéias pouco exatas, mas com muita coragem e esperança, os Glufke empreenderam a viagem.


Da Alemanha para o Brasil

A grande viagem começou no dia 15 de setembro de 1909, conforme registrou Carl na Bíblia familiar.

Os Glufke partiram de Ditfurt, onde morava a família de Elise, para Rotterdam, na Holanda. A passagem pela Holanda e o embarque em Rotterdam se justificavam por vigorar na Alemanha, então, uma lei que dificultava a emigração.

Caixas e caixotes foram despachados até o trem e dele para o navio. A bagagem pessoal não era grande e foi transportada da casa da família de Elise até a estação ferroviária em carrinho puxado por um cão são-bernardo. Além disso, cada uma das crianças maiores carregava uma mochila às costas; consta que na Alfred estavam travesseiro e o penico de Herta.



Em Rotterdam, os Glufke embarcaram no navio “Amstelland” – antigo e sem conforto – para a grande travessia. A viagem transcorreu normalmente. No entanto, como a família viajou na terceira classe, não é difícil imaginar a qualidade da alimentação, bem como o desconforto causado por más condições de ventilação e por instalações sanitárias muito deficientes. Além disso, é provável que o navio balançasse muito, pois os navios da época eram pequenos e não tinham estabilizadores.


Certamente enfrentando problemas e depois de semanas de viagem, a família Glufke chegou ao Rio de Janeiro, no dia 11 de outubro de 1909.

De acordo com o registro do “Escriptorio de Immigração” da “Directoria Geral do Serviço de Povoamento”, que funcionava na cidade do Rio de Janeiro, a saúde dos passageiros do “paquete hollandez” foi boa durante a travessia, não tendo havido mortalidade e tendo ocorrido um nascimento. Na lista dos “578 immigrantes” que viajaram no “Amstelland”, a família Glufke está registrada sob os números 186 a 192. No registro constam os nomes de todos, a indicação de que Carl é o chefe da família e o parentesco dos demais em relação a ele (esposa, filhos), idade, sexo, estado civil, nacionalidade, profissão (Carl consta como agricultor), religião (protestante) e instrução (se sabem ler e escrever). Quanto às idades, é interessante destacar: Carl – 34 anos; Elise – 28 anos; Erna – 10 anos; Waldemar – 9 anos; Frieda – 7 anos; Alfred – 5 anos; Herta – 2 anos. Em relação ao casal e aos filhos Erna, Waldemar e Frieda foi registrado que sabem ler e escrever.

Como era de praxe, os Glufke tiveram de cumprir as formalidades na Ilha das Flores, o que incluía a verificação de condições de saúde.

No “Registro de entrada de immigrantes” da “hospedaria de Immigrantes da Ilha das Flores”, a família Glufke consta nos números 282 a 288. A data de entrada é 11 de outubro de 1909 e a saída é 17 de outubro de 1909. O registro incluí nomes, estado civil, nacionalidade e profissão. Está registrado também o nome do navio em que vieram – “Amstelland” – bem como o destino da família: Porto Alegre. Não há registro do navio que os levou até o Rio Grande do Sul.

Os Glufke embarcaram em um vapor costeiro, considerado de grande luxo se comparado ao “Amstelland”, para viajarem até o Rio Grande do Sul.

Um fato relativo à viagem do Rio de Janeiro a Rio Grande era sempre lembrado pela Elise: Herta, então com apenas 2 anos de idade, resolveu apelidar o cozinheiro do navio, que era negro, de Bolo-Bolo. O cozinheiro deu interpretação diferente às expressões da menina e, por isso, lhe trazia fatias de bolo ou bolachas, dando força ao apelido.

De Rio Grande, a família viajou de trem até Cruz Alta, fazendo várias baldeações, e de carro de bois até Ijuí, que era apenas um povoado. Ali, foi necessário abrir caixas e caixotes para acomodar a bagagem no lombo de mulas, pois havia apenas uma picada ligando a sede do município à linha 23 Leste, destino final da grande viagem, que terminou no dia 28 de outubro de 1909, segundo registro de Carl e Elise em Bíblia da família.


Ijuí/RS

No caso do Brasil, ao contrário do que conta a história oficial, a maioria dos imigrantes não recebeu auxílio algum, ou muito pouco, do “País que os acolhia”; as famílias eram largadas, literalmente, “no mato sem cachorro”.

Com os Glufke também foi assim. Quando chegaram à “terra prometida” só encontraram mato – um local quase desabitado, sem recursos. A primeiroa rovidência foi construir um abrigo. Enquanto ele era construído, Elise e as crianças permaneceram na “vila”. Os conhecimentos de carpintaria, apesar de sua limitada experiência, foram de grande valia para Carl neste momento. Baseado neles e com material de que dispunha – galhos de árvores, folhas de palmeira, barro – construi a “moradia”, na realidade apenas um rancho, que cosntava de duas partes: uma, os “quartos” para acomodar a família; outra, a cozinha, com fogo de chão.

Carl teve o cuidado de construir o rancho em local um pouco elevado, mesmo que mais afastado do riacho que por ali passava. Um vizinho, achando muito prático e até romântico morar às margens do arroio, foi surpreendido, em uma noite de muita chuva, pela água entrando no rancho.

Assim que possível, a família veio para junto de Carl. Foi então que tomaram posse de seus “domínios” e enfrentaram a rude vida no mato.

Quando o tempo estava bom, era fogo de chão, aceso no pátio e coberto com chapa de ferro, que Elise e, na ausência da mãe, Erna cozinhavam. Para assar os primeiros pães que fez no Brasil, Elise acendia fogo no chão e depois colocava a forma com a massa no local aquecido, sob a chapa de ferro, cobrindo tudo com folhas.

As crianças precisavam de leite; pó isso, Carl trocou sua única fatiota por uma vaca. Como suas mãos estavam inchadas em decorrência do trabalho na roça, ao qual não estava acostumado, Carl tinha guardado sua aliança no bolso do casaco. Na hora de entregar a fatiota, não se lembrou disso – e a aliança se foi!

Nessa pequena propriedade, Carl tentou plantar alguma coisa, sem muito sucesso. Faltava-lhe, como muitos outros, o conhecimento da terra, das plantas e de como plantá-las. Ninguém dava aos recém-chegados, uma orientação segura; cada um agia como acreditava ser certo, e acontecia um eterno “começar da estaca zero”.

Além disso, a terra tinha que ser paga. O pagamento, muitas vezes, era feito com trabalho nas estradas – pouco mais do que picadas, quase sempre - , as quais eram abertas com picaretas, foices e enxadas. Na maioria dos casos, as ligações entre as colônias e a sede e entre as diferentes colônias eram feitas pelos colonos.

Voltando a Carl e Elise, é fácil imaginar o estado de ânimo de ambos ao enfrentarem tantas dificuldades: o isolamento, a terra inculta, a gente estranha, a falta do essencial em quase tudo. O que os mantinha e movia era a esperança, para si e para os filhos, de dias melhores do que a vida na Alemanha lhes propiciaria.

Foi em Ijuí, na cabana que abrigava a família, que nasceu o sexto filho e o primeiro dos filhos brasileiros, batizado Hermannn (1910), mais tarde Hermann adotou legalmente o nome Germano, passageiro clandestino da grande viagem, como ele mesmo costuma dizer.

A família permaneceu pouco tempo em Ijuí.

Quando Germano tinha oito semanas, Elise foi até a Linha 8 Oeste, também em Ijuí, para fazer um parto. A viagem foi a cavalo, levando o bebê, que ainda mamava. Houve engano nos cálculos, e o parto só ocorreu seis semanas depois, mas Elise tinha de esperar que ele acontecesse. Carl e os outros filhos ficaram na colônia. Erna, uma criança de onze anos, tinha de fazer todas as lides domésticas.

Feito o parto, Elise e Germano voltaram. Carl foi ao encontro deles, até uma “venda”. Lá encontraram dois senhores ligados a Empresa Colonizadora de Neu-Württenberg. Germano foi devidamente admirado por eles. Consta que, brincando, Carl lhes perguntou: “Não estão querendo um bebê forte como este?” Ao que um dos senhores teria respondido: “Não é exatamente de um bebê que precisamos, mas de uma parteira.” Elise, entrando na conversa, disse: “Pois já encontraram!” E ali mesmo foi acertado um contrato: Elise seria parteira nessa nova e florescente colônia!

A terra foi devolvida e mais uma mudança aconteceu na vida da família!


Neu-Württenberg (Panambi)/RS

Em poema dedicado ao filho Germano quando ele completou 40 anos, Elise assim escreveu:

“Nach Neu-Württenberg wollten wir geh’n
Wir hatten gehört dort sei es schön!
Es gabe dort Schule und allerlei gutes
Darum gingen wir frohen Mute.”

A existência de escola e de outras “coisas boas” – igreja, clube, coral, por exemplo – fazia de Neu-Württenberg de 1910 uma localidade de nível cultural e social bem melhor que a Linha 23 Leste de Ijuí.

Em Neu-Württenberg, a família morou, nos primeiros tempos, em uma pequena chácara dentro dos limites da vila. Carl trabalhava como carpinteiro, principalmente na construção de escolas nas novas picadas da região. Elise, além das múltiplas tarefas de mãe e dona de casa, assumiu suas funções de parteira contratada.

Algum tempo depois Carl adquiriu uma área de terra de 25 hectares para agricultura, a três quilômetros da sede, na qual já havia uma casa. Inicialmente toda a família se envolveu no plantio. Mais tarde, uma olaria foi construída na propriedade.

Na “Kolonie”, como era chamada essa propriedade, nasceram mais três filhos: Hedwig (1914) – a Hedi, Erika (1917) e Willy (1921).

Em Neu-Württenberg aconteceram alguns fatos importantes da vida familiar.
No dia 10 de novembro de 1923 foram comemorados as Bodas de Prata do casal. Nesta mesma época, o casal Glufke decidiu vender a propriedade. Havia vários razões: os filhos Waldemar e Alfred já se dedicavam aos ofícios que haviam aprendido. Erna estava casada e Frida estava noiva. E o principal motivo era que Carl e Elise desejavam outro tipo de vida para si e para os filhos.

Quando Carl e Elise visitaram sua terra natal, de 7 de maio a 24 de outubro de 1924, a Alemanha vivia o período pós-inflação de 1923 e o dinheiro brasileiro tinha valor nos países europeus. Por isso, o casal pôde viajar pela Alemanha, visitar parentes e até comprar utensílios e objetos para a casa e pequenos presentes para os filhos. Quando voltaram, uma grande mudança ocorreu na vida de toda a família Glufke.
  
Mudança para Porto Feliz (Mondaí)/SC

A Empresa Chapecó-Pepery Limitada, colonizadora da região convidou Waldemar, o filho mais velho de Carl e Elise, para estabelecer uma casa comercial em Porto Feliz, atual Mondaí, em Santa Catarina. O estabelecimento destinava-se a prover mantimentos e utensílios necessários aos pioneiros da localidade.

Waldemar incluiu seu pai como sócio da casa comercial. Assim quando Karl e Elise voltaram da Alemanha, Karl foi imediatamente a Porto Feliz, para assumir suas atividades no novo negócio e providenciar casa para a família.

Em fevereiro de 1925, Carl, Elise e os filhos Hedi, Erika e Willy foram morar em porto Feliz. Como muitos pioneiros, antes e depois deles, viajaram no mesmo caminhão que levava a mudança.

Os outros filhos de Carl e Elise também foram morar em Porto Feliz, em momentos diferentes.

Os Glufke em Porto Feliz (Mondaí)/SC

Em Porto Feliz, atual Mondaí, que os Glufke “criaram raízes”. Até hoje a localidade serve de referência na história familiar. Apesar de alguns filhois terem casado antes da mudança para Porto Feliz, pode-se dizer que foi de lá que filhos, netos e, recentemente, bisnetos de Carl e Elise partiram para viver em outros lugares do Brasil. Estar em Porto Feliz (ou Mondaí), durante muito tempo e para a maioria dos Glufke, significava “estar em casa”.

Em 1926 nasceu o último filho do casal: Hellmut. Os Glufke, como todos os pioneiros de Porto Feliz, enfrentavam os problemas da melhor forma possível, sem se deixaram abater por eles. Cada um no seu posto: na casa comercial, no transporte, nos trabalhos domésticos e Elise como parteira.

No Natal de 1927, Carl Glufke adoeceu em Porto Feliz. Apresentou melhoras e em janeiro de 1928 viajou a Neu-Wüttenberg para consultar médico. Este constatou que Carl sofrera um leve derrame cerebral, sem seqüelas e recomendou descanso. Ele ficou na casa da filha Frieda em Neu-Wüttenberg, mas em fevereiro teve outro derrame e veio a falecer no dia 7 de fevereiro de 1928. Seu corpo foi levado a Porto Feliz, para lá ser enterrado.

Com a morte de Carl terminou uma etapa decisiva na vida da família Glufke, incluindo a fase da vinda para o Brasil, a fase de adaptação a um novo ambiente em terras no Rio Grande do Sul e a fase de pioneirismo e estabelecimento em Porto Feliz.

Opa Glufke morreu antes de concretizar totalmente o sonho que o trouxe ao Brasil: ver todos os filhos encaminhados para uma vida melhor do que possivelmente teriam na Alemanha. A afirmativa é feita considerando a época em que os fatos narrados aconteceram, mas viu realizada uma parte desse sonho: tinha casa própria, sociedade em uma casa comercial, filhos se afirmando profissionalmente. Além disso, a família crescera: dos dez filhos, cinco estavam casados e já lhe haviam dado nove netos.

Em 1932 a “grande família” começou a se dispersar, no sentido de morar em lugares diferentes, para atender interesses e necessidades individuais ou de cada nova família que se formava.

Assim em fevereiro de 1936, Elise se mudou para Lajeado, junto com Willy e Hellmut.  Em 1951, na residência de Erna, em Porto Alegre,  foi comemorado o “Jubileu de Ouro” de Elise como parteira. Em seus cinqüenta anos de profissão, Elise ajudou a trazer ao mundo quase 3000 crianças.

Em 10 de dezembro de 1962, Elise faleceu em Lajeado e conforme seu desejo, lá foi sepultada.

Como em todas famílias, momentos de alegria e de tristeza têm se sucedido na vida dos descendentes de Carl e Elise Glufke. Os dois sonharam uma vida melhor para os filhos, os netos e para as gerações futuras. Se a realidade nem sempre correspondeu totalmente ao sonho dos que atravessaram o oceano em busca de uma vida melhor, é verdade que esta “vida melhor” foi amplamente alcançada, à custa de trabalho constante e grandes sacrifícios, mas também com muitas alegrias e muitas realizações.

É verdade, também, que seus descendentes souberam honrar os ensinamentos do casal Carl e Elise, no sentido de integridade de caráter e trabalho honesto na conquista de uma vida digna, pacífica e saudável, baseada no esforço pessoal e preparo profissional. Cada um a seu modo lutou para conquistar um lugar na comunidade em que vive e vive de modo a preservar o lugar conquistado. Este é, talvez, o legado maior que eles deixaram para seus descendentes.

Por tudo isso e pela coragem de enfrentar o desconhecido “outro lado do mundo” no empenho de propiciar um futuro mais promissor à sua família, Carl e Elise Glufke merecem admiração, respeito e reconhecimento e, principalmente, merecem ser afetuosamente lembrados por filhos, netos e bisnetos e pelos filhos, netos e bisnetos destes.

(Histórico familiar retirado do livro “OS GLUFKE NO BRASIL – pequena crônica familiar” de Izabella Kertész, publicado em 1998).